O Mar e as Pontes



Depois de passar mais de um mês no estado do Espírito Santo na cidade de Vila Velha, cheguei à conclusão de que meu encantamento e identificação por esta cidade, além de está relacionado com as pessoas daqui, tem a ver com duas outras imagens muito presentes na minha vida: o mar e as pontes.

Assim como Olinda e Recife estão ligadas pelo mar e por uma ponte, Vitória e Vilha Velha também. Do alto de Olinda podemos ver Recife. Do alto de Vila Velha podemos contemplar Vitória. Como as pontes do Recife e daqui têm significado para mim!

As pontes nos permitem descobrir outros e novos lugares, conhecer novas pessoas, ver outras paisagens. Podemos começar novas etapas e escrever novas histórias. As pontes daqui me deram novos amigos, novos irmãos. Às vezes do outro lado da ponte podemos encontrar lugares que curam.

Como canta o poeta João Alexandre: "É obra do Espírito Santo este lugar..."
A felicidade que encontrei aqui "tem um gosto de Vitória..."
Ah Vilha Velha como alegrastes meu coração!
Daniel Barros


Por uma Teologia Prática e Sensível

Frei Honório Rito em seu livro, Introdução à Teologia, diz em outras palavras que a teologia só começa a ser teologia, quando se torna prática. Esta afirmação levanta a velha discussão sobre a distância entre a teoria e a prática, entre o discurso e a vida.
Aprofundando esta idéia eu diria que quando o estudo teológico se torna prático, só então começa a ser relevante. Primeiro, na vida de quem faz a teologia, o teólogo. E depois na vida da comunidade onde este teólogo convive.

A ausência da prática na teologia permite que grande parte da sociedade pense que o teólogo é aquele que se ocupa tão somente das questões ligadas ao céu. Um ser alheio a tudo e a todas as coisas que acontecem aqui em baixo. Isto não é verdade. Ou pelo menos não deveria ser. Esta conclusão é a conseqüência imediata da falta de uma ação prática da teologia, que é percebida pelas pessoas, numa sociedade que a cada dia carece e padece sem encontrar respostas às suas demandas existenciais.

O teólogo cristão precisa entender que a recomendação paulina de "buscar... e pensar nas coisas lá do alto e não nas que são daqui da terra" (Colossenses 3:1-2), não é uma proposta de vida alienada. Paulo não nos ensina que ao buscar e pensar nas virtudes e valores de Deus, devemos abandonar a vida comum.

O ensino do texto é que em buscando e pensando nas coisas que são lá do alto, devemos repensar a maneira como vivemos aqui em baixo. Ou seja, a proposta do apóstolo é de uma existência relevante. O que nos permite pensar numa prática teológica a meu ver, de inclusão e não de isolamento.

O texto biblico nos desafia revermos nossa espiritualidade e questionarmos a superficial religiosidade que nos envolve, que aparentemente conduz nossas mentes ao "céu", mas deixa nossos pés queimando no "inferno" sem sentirmos nada, pois perdemos a sensibilidade do evangelho.

O teólogo cristão tem por missão e dever, esclarecer e possibilitar que as pessoas (crentes e não crentes) deixem a alienação quanto ao modo de se relacionarem com Deus. Conduzí-las à uma espiritualidade autêntica conquistada e desenvolvida mediante uma experiência verdadeira e constante com Jesus, o Cristo. Rever a nossa espiritualidade tendo como referência o testemunho de Jesus é um convite à Graça, ao renovo, à transformação, à conversão.

É ter a coragem de liberta-se das amarras religiosas institucionais e denominacionais e de suas 'cartilhas de crente'. É poder redescobrir a beleza da simplicidade de ser apenas cristão.

Aquele que habitava lá no alto, desceu a este mundo aqui e nos ensinou quão nociva era e continua sendo a religiosidade desprovida de sensibilidade para a vida. Jesus nos ensinou que a vida com Deus deve tornar a nossa própria, relevante para a vida das pessoas com quem nos relacionamos e para a vida do lugar onde habitamos.

Ele conviveu com as pessoas e andou entre elas. Foi sensível a dor do outro e operou milagres trazendo para vida um leproso, um cego de nascença e um jovem endemoniado que vivia nos sepulcros; restaurando-lhes o sorriso no rosto, a dignidade; reinserindo-os à vida comum junto aos seus familiares e amigos.

O Senhor Jesus não teve receio em "macular" o seu nome ou o seu "ministério" ao conversar com os marginalizados de sua época. Ele esteve entre pecadores, com gente de reputação questionável como Zaqueu, Maria Madalena. Foi gracioso com uma mulher adúltera renovando-lhe a esperança de ajustar-se na vida não pecando mais daquela forma. Quem não está disposto a "manchar" o seu nome, seu ministério ou o nome de uma estrutura religiosa pera abençoar pessoas, não é digno de cuidar delas. Não é digno de orgulhar-se apenas do título de pastor.

Quando olho hoje para o testemunho de vida de Jesus tenho quase certeza que se ele estivesse no Brasil, não faria parte de "igreja" alguma que se diz ser cristã.

Em alguma denominação, Jesus teria seus sermões reprovados e questionados por serem tão simples e sem profundidade exegética. Seria chamado atenção em algum concílio por ser tão espontâneo e não seguir à risca os manuais das sociedades internas.

Em outra seria "convencido" a dar testemunhos de que seu batismo realmente foi realizado da forma "correta", por imersão. E sendo de outra denominação não participaria da santa ceia.

Provavelmente em alguma igreja teria que provar sua divindade falando em línguas estranhas e só pregaria de paletó e com um detalhe: sem corte atrás.
Em algumas comunidades chamadas neopentecostais, coitado de Jesus...

A reflexão teológica alienada do nosso tempo tornou o evangelicalismo brasileiro uma tragédia. Poucos são aqueles que têm o pensamento teológico livre. A reflexão teológica "tupiniquim" tornou-se refém das instituições religiosas onde cada uma delas cria sua "teologia" em benefício da sua própria infra-estrutura.

Alguns pastores (teólogos de gabinete) estão mais comprometidos com o ativismo de suas "igrejas" que com a relevância delas na vida das pessoas e na comunidade onde estão instaladas. Fechados em suas salas, esquecem da dureza que é viver lá fora. Por isso não percebem que "os campos estão brancos para colheita". Não "conseguem" enxergar as pessoas "como ovelhas que não têm pastor".

Alguns teólogos de gabinete reduzem a ação e a visão das comunidades eclesiásticas ao mundo estrutural, ensinando que o Reino de Deus tem seus limites na denominação. Os teólogos de gabinete precisam andar pelas ruas, tomar um ônibus, ir a um mercado público, andar numa feira, estar entre as pessoas simples, senti-las. Não se faz uma teologia relevante distante da realidade que nos cerca. O mundo que está fora das estruturas é um outro totalmente diferente, não é fantasia.
O que o Evangelho tem a ver com a vida das pessoas aqui em baixo?
O que estamos fazendo neste mundo?
O evangelho deve ser anunciado a quem?
Qual o propósito dessa "igreja" aqui?
Em que outro mundo seremos sal e luz?
Daniel Barros.

"...Amigos mais chegados que um irmão"

Diz o ditado que se quisermos passar bem pela vida devemos "ter um filho, plantar uma árvore e escrever um livro". Tais coisas são importantes e pelo menos uma árvore eu já plantei.

Mas esta frase não está completa para mim. À ela eu acrescentaria que se quisermos passar bem pela vida também devemos fazer amigos.
Eu agradeço a Deus porque tenho alguns e verdadeiros amigos e amigas. Nomes como Pedro, Jânio, Alexandre, Luciano, Cláudio, Roberta(Beta), Betânia, Suzana (Su), Raquel Aquino, Markinhos, e outros antigos e novos amigos conquistados, me fazem acreditar que não estou sozinho nessa vida.

A Bíblia nos diz que "há amigos mais chegados que um irmão" (Provérbios). Isto é a mais plena verdade quando penso em pessoas como as que eu mencionei, mas de forma carinhosa e justa também o é quando penso em Iranildo. Nele, quero homenagear todos os meus verdadeiros amigos citados ou não. Iranildo é meu conterrâneo, meu colega de ministério, meu parceiro de angústias e alegrias, meu conselheiro, meu pastor em determinados momentos. Iran... Meu amigo, meu irmão.

A amizade entre nós é fortalecida não apenas pela proximidade, pois durante a maior parte do tempo estamos distantes geograficamente, mas pela identidade, pela empatia com o outro. Nossa amizade é fortalecida pelo reencontro. Cada vez que isto acontece, uma celebração. Foi assim com os amigos Davi e Jônatas que fizeram um pacto de amizade. Podemos citar outros exemplos bíblicos e além deles. Mas, ao evidenciar um exemplo bíblico de amizade é com a intenção clara de dizer que entendo a minha amizade com o Iran, como algo sagrado, coisa de Deus para abençoar a minha vida.

Obrigado Iran pelo seu cuidado, respeito, sinceridade, preocupação, hospitalidade, desprendimento, esforço em meu favor, pelo zêlo, pela força, pela atenção dispensada em todos os momentos desde o dia em que nos conhecemos. Obrigado por acreditar em mim, no meu ministério. Obrigado pelo coração gigante e sempre aberto.
Obrigado por ser meu amigo/irmão.
Obrigado meu Deus pela vida do Iran (Quem é o cantor? rsrsrsrs).

Impressões...

Ao falar sobre impressões quero estar longe da máxima que diz que a “impressão é a primeira que fica”. Para mim, esta lógica reflete tão somente a inclinação cruel que a nossa natureza humana tem em fazer reducionismos e imprimir rótulos sobre outras pessoas, lugares e situações.
Ela mascara um sentimento pequeno alojado em nossa alma, o preconceito (pré-conceito).

O preconceito tem a capacidade de nos privar da aventura da descoberta, de experimentar, conhecer, sentir e somente depois concluir. O preconceito elimina etapas, conclui e reduz tudo e qualquer um em um instante eterno.
Sentimento que herdamos de pessoas que fizeram “impressões” (in-pressões) em nosso lugar. Volta e meia este sentimento me alcança, pois não me engano sobre a minha própria natureza. Vou vivendo e lutando contra a tentação de inserir à minha “herança” novas rotulações.
Precisamos fazer impressões. E fazê-las não significa pensar, agir ou realizar as mesmas coisas e/ou do mesmo jeito que pessoas diferentes de nós pensam e agem. Entendo fazer impressões como "colocar-se no..." local, no sentir, no espaço do outro. Fazer impressões é permitir-se olhar com a ótica do outro.

A rota do preconceito é um salto do começo (o que vimos) para o fim (o que sentimos).
Entre um ponto e outro se encontra o campo inexplorado das impressões. Verdadeiro “latifúndio” na alma que impede que sejamos mais férteis, mais generosos, mais questionados. E assim, nos tornamos menos conhecedores, mais ignorantes sobre a vida, sobre as pessoas, sobre o local onde vivemos e existimos e até sobre Deus e sua graça.

As primeiras coisas que vimos e sentimos nunca permanecem as mesmas quando nos aproximamos delas. Percepções aparentemente “boas” podem se tornar conclusões ruins e vice versa. Por isso considero o valor da aproximação. Ela nos permite rever o olhar e concluir de modo diferente.

Ao olhar alguém, ao sentir algo, ao ler um livro ou quando estiver em algum lugar, faça impressões. Elas não o impedirão de chegar às suas próprias conclusões. Contudo não conclua nada antes de ouvir, de sentir, de se aproximar, de descobrir o que você enxerga encoberto (en-coberto). Se impressione com a vida, converse com as pessoas, sinta cheiros, novos sabores. Passeie nos lugares que você ainda não foi, vá a um mercado público, à uma feira e não apenas a um shopping (tenho conclusões sobre este ambiente).

Permita que outras pessoas, outros lugares e situações façam incursões na sua alma, olhe nos olhos de alguém eles são "as janelas da alma". Faça descobertas, aproxime-se, lute contra a sua natureza e depois conclua, você tem esse direito. Só não esqueça de amar, de respeitar, de procurar entender, de ser tolerante. Porque chegar a uma conclusão não significa que você chegou ao fim de tudo em detrimento de todos e de todas as coisas. Você chegou apenas à sua própria conclusão. Ela não é a melhor e nem a única. Existem várias outras.

Viveríamos melhor com nós mesmos, com as pessoas que convivemos e com o lugar aonde habitamos se nos impressioná-se-mos mais.
Pelo menos esta é a impressão que eu tenho.
Daniel Barros.