Resiliência e Graça


As ciências humanas e dentre elas a Psicologia reserva atenção especial sobre a capacidade que homens e mulheres têm de não somente resistir, mas de superar e se reestruturarem ao passarem por situações difíceis na vida. Esta capacidade de alguém chegar ao 'fundo do poço' e sair de lá para a vida trazendo consigo experiências de dor e amadurecimento os especialistas chamam de Resiliência.



Cada um de nós tem esta capacidade natural que nos permite olhar para trás e perceber que passamos algumas situações desagradáveis mas, conseguimos superá-las. Em determinados momentos achamos que jamais sairíamos de um contexto e hoje nos vemos olhando aquilo que parecia ser tão difícil naquele momento da nossa existência e hoje é apenas uma lembrança de um tempo que passou.


Contudo, a Bíblia aponta para algumas situações onde somente a capacidade humana de passar, suportar e superar momentos difíceis não seria suficiente para o levantar-se. O cristianismo apresenta uma outra capacidade gerada no coração daqueles que experimentam uma relação autêntica com Deus, que é a possibilidade de alguém sentir-se ao mesmo tempo triste e feliz.


Na mentalidade de muitos isto é contraditório e impossível; Se estou triste não há como estar alegre ao mesmo tempo. Se sinto dor não há como ao mesmo tempo sorrir. Uma coisa suplanta a outra. Ou eu estou feliz ou alegre.


É diante desta outra capacidade, sobre humana, que toda a explicação teórica científica não subsiste a explicação bíblica. Para a psicologia o sentir-se bem requer a migração de um estado de desconforto para um outro que seja considerado ou percebido como bom. Ou seja, o ruim está num lugar e o bom em outro. A perspectiva bíblica-teológica não obedece esta lógica pois na tristeza ou na dor homens e mulheres de Deus podem experimentar alegria e paz.


Foi assim com Daniel e seus amigos na Babilônia foram sentenciados a serem lançados numa fornalha ardente e estavam calmos, plenos em sua confiança em Deus; Foi assim Estêvão quando estava sendo apedrejado pelos religiosos do seu tempo e joelhos entregava o seu espírito a Deus pedindo-Lhe que não lhes imputassem aquele ato por pecado; Foi assim com Davi quando perseguido por seu filho Absalão encontrou paz e refúgio na caverna de Adulão; Foi assim com Sara, mulher de Abraão, quando esperou durante vinte e cinco anos crendo numa promessa de Deus que seu filho iria nascer, Isaque. Foi assim com Jó que num só dia perdeu seus dez filhos, todo os seus bens e quase todos os seus servos, além da indiferença de todos que o cercavam e até da sua própria esposa.


Nestas situações estes homens e mulheres experimentaram o sabor mais amargo da intolerância e idolatria dos babilônios, a perseguição e morte por amor a Cristo, a ira mortal de um filho contra o seu próprio pai que chegou a fazer-se de louco para não ser morto, a terrível angústia desenvolvida pelo fator tempo, gerada no coração de uma mulher que desejava ser mãe e sofria com sua esterilidade; O sofrimento imprevisível de um homem que foi considerado o mais íntegro entre todos.


Estas pessoas experimentaram o 'fundo do poço' em algum momento de suas vidas e permaneceriam lá se dependessem apenas de si mesmos e de suas capacidades naturais de superação nas dificuldades que enfrentaram.


A grande verdade é que existem situações na vida em que a capacidade de ser resiliente não é suficiente. Existem situações em que perdemos a força e a vontade de viver e pensamos desistir de tudo.


Estes homens e mulheres do passado que andaram com Deus experimentaram mais que força humana. Eles experimentaram da Graça de Deus sobre as suas vidas. Quando falta a resiliência abre-se espaço para a experiência com a Graça divina que pode ser compreendida como a ação direta de Deus sobre as circunstâncias da nossa existência que apesar dos pesares, nos impulsiona, nos renova, nos consola, fortalece, anima e nos sustenta.


É o experimentar desta graça que faz o salmista e rei Davi dizer em um de seus poemas, o de número 63:3 o seguinte: "a Tua graça é melhor que a vida e os meus lábios te louvam".

É o experimentar desta Graça que fez o apóstolo Paulo ser confrontado com a sua fragilidade e incapacidade humana de suportar o seu "espinho na carne" (2Co.12:7-10). Sentia-se humilhado e esbofeteado no rosto pelo próprio Satanás que lhe acusava. Mas foi neste momento que foi confortado quando ouviu o próprio Senhor lhe dizer: "A minha Graça te basta". Então se alegrou em sua fraqueza, nas injúrias, nas necessidades que sentia, nas perseguições, nas angústias e tudo isto por amor a Jesus Cristo, e este mesmo o fez compreeender a "contradição aparente e santa" daquele momento: que quando Paulo se sentia fraco é que se tornava mais forte não por ele mesmo, mas pela Graça de Deus.


Não existe nada mais forte e de maior poder que possibilite homens e mulheres passarem, suportarem e reerguerem-se para a vida que a Graça de Deus. Precisamos em algum momento da nossa existência e experiência com Deus entender que "tudo é Graça e a Graça é tudo".